Manual Político do Cidadão Portuguez
Trindade Coelho
Em 1906, José Francisco Trindade Coelho publicou um “manual político” extenso e completo. Inspirou-se na ‘Instruction Civique” de Numa Droz (Suiça). Infelizmente, o nível de alfabetização, de literacia e de participação política era tão baixo que o manual apenas aproveito a um pequeno número de portugueses. Ainda assim, a edição esgotou ao fim de um ano. Trindade Coelho foi sensível ao tema da alfabetização e da literacia. Escreveu vários ‘Livros de Leitura‘, a ‘Cartilha do Povo‘ (1901) e ‘O ABC do Povo’ (1902). Este “manual político” é um testemunho do sistema político português nos últimos anos da monarquia. Demasiado fiel à tradução de Droz, Trindade Coelho deixou no seu “manual” esta afirmação: “a forma de governo que nos parece melhor, para um povo instruído e patriota, é a república democrática e federativa. Nesse regime, o povo é o verdadeiro soberano tanto de facto como de direito” (páginas 35-36). Trindade Coelho era monárquico. Como podia ele considerar que a melhor forma de governo seria republicana, democrática e federativa? Aparentemente, Trindade Coelho devia pensar que estas três coisas só são adequadas para “um povo instruído e patriota” e que o povo português estava longe de o ser…
Outra particularidade datada deste “manual” são as dezenas de páginas ocupadas com críticas às instituições religiosas, especialmente a Companhia de Jesus. Trindade Coelho culpa estas instituições de serem causa “do nosso atraso e da nossa falta de instrução e de educação“(página 305). A defesa da laicização da educação esteve, nesta época, afetada pelo anticlericalismo e, por conseguinte, longe da ideia de liberdade religiosa. Como a Igreja era conotada com “a reação“, Trindade Coelho fez questão de separar bem as águas entre a “democracia social” e a “democracia cristã”, e de manifestar a sua esperança na extinção da propriedade sobre os instrumentos de produção na abolição das classes sociais. Embora as 700 páginas cheguem e sobrem para sustentar o título de “manual”, Trindade Coelho não resistiu a usá-lo como panfleto. Isso torna a leitura ainda mais interessante.