A História política das duas décadas mais recentes, vista pelo historiador Timothy Snyder, dá conta da forma como, passo a passo, o regime de Vladimir Putin trabalhou para a divisão e enfraquecimento da Europa e do Ocidente em geral para poder satisfazer os interesses de um regime totalitário, corrupto e feito a medida de uma oligarquia. ‘The Road to Unfreedom‘, publicado em 2018, dá conta de como Donald Trump foi cultivado e financiado pelo regime russo.
Em 1906, José Francisco Trindade Coelho publicou um “manual político” extenso e completo. Inspirou-se na ‘Instruction Civique” de Numa Droz (Suiça). Infelizmente, o nível de alfabetização, de literacia e de participação política era tão baixo que o manual apenas aproveito a um pequeno número de portugueses. Ainda assim, a edição esgotou ao fim de um ano. Trindade Coelho foi sensível ao tema da alfabetização e da literacia. Escreveu vários ‘Livros de Leitura‘, a ‘Cartilha do Povo‘ (1901) e ‘O ABC do Povo’ (1902). Este “manual político” é um testemunho do sistema político português nos últimos anos da monarquia. Demasiado fiel à tradução de Droz, Trindade Coelho deixou no seu “manual” esta afirmação: “a forma de governo que nos parece melhor, para um povo instruído e patriota, é a república democrática e federativa. Nesse regime, o povo é o verdadeiro soberano tanto de facto como de direito” (páginas 35-36). Trindade Coelho era monárquico. Como podia ele considerar que a melhor forma de governo seria republicana, democrática e federativa? Aparentemente, Trindade Coelho devia pensar que estas três coisas só são adequadas para “um povo instruído e patriota” e que o povo português estava longe de o ser… Outra particularidade datada deste “manual” são as dezenas de páginas ocupadas com críticas às instituições religiosas, especialmente a Companhia de Jesus. Trindade Coelho culpa estas instituições de serem causa “do nosso atraso e da nossa falta de instrução e de educação“(página 305). A defesa da laicização da educação esteve, nesta época, afetada pelo anticlericalismo e, por conseguinte, longe da ideia de liberdade religiosa. Como a Igreja era conotada com “a reação“, Trindade Coelho fez questão de separar bem as águas entre a “democracia social” e a “democracia cristã”, e de manifestar a sua esperança na extinção da propriedade sobre os instrumentos de produção na abolição das classes sociais. Embora as 700 páginas cheguem e sobrem para sustentar o título de “manual”, Trindade Coelho não resistiu a usá-lo como panfleto. Isso torna a leitura ainda mais interessante.
Quando, em 2015, Serhii Plokhii deu à sua História da Ucrânia o título ‘The Gates of Europe’, já tinha começado a primeira invasão da Ucrânia pela Rússia de Putin. A Rússia tinha anexado a Crimeia e começou a fomentar uma guerra suja separatista nas regiões de Donetsk e Lugansk. Em 2022, o título escolhido revelo-se premonitório: com a segunda invasão, começou uma guerra duríssima em que se joga o futuro da Europa. A maior parete dos europeus teve consciência do pouco que sabe da história da Ucrânia como nação. A melhor forma de ganhar imunidade à propaganda é começar por conhecer a história da Ucrânia. Serhii Plokhii é o autor ideal: há anos que ensina História da Ucrânia na Universidade de Harvard.
O maior resgate de informação secreta da era da ‘guerra fria’;
O maior golpe sofrido pelo KGB;
Milhares de agentes e e informadores expostos;
Informadores do KGB em Portugal.
Em 1972, o KGB concluiu a construção de um novo edifício em Yasenevo (sul de Moscovo) para os seus arquivos. Vasili Mitrokhin foi encarregue da missão de classificar e transferir os documentos para o novo edifício. A operação demorou 12 anos. Desiludido com o regime soviético Mitrokhin começou a preparar a sua reforma. Ao longo desses doze anos, transcreveu à mão documentos secretos e fê-los sair do edifício escondidos nos sapatos. Em casa, acumulou-os em latas de leite colocadas sob o soalho ou enterradas no quinta da casa de campo. No dia 24 de março de 1992 (um ano depois da dissolução da união soviética), viajou para Riga com alguns desses papéis. Na embaixada dos EUA, não foi considerado credível. Na embaixada do Reino Unido, foi recebido por um jovem diplomata decidiu que comunicou o assunto ao MI6 (a designação usual do Secret Intelligence Service, SIS) e pediu a Mitrokhin para voltar dias depois. Mitrokhin compareceu num local discreto, entregou 10 envelopes com mais de 2000 páginas. Ficou de voltar em junho com mais documentos. Douglas Hurd, secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros do governo de Margaret Tatcher, aprovou a resgate dos documentos escondidos em casa de Mitrokhin e a concessão de asino para o agente russo e a sua família. Operacionais do MI6 visitaram a ‘dacha’ (casa de campo) de Mitrokhin e precisaram de cinco bagageiras de automóvel para trazer os manuscritos de Mitrokhin, que cobriam mais de 70 anos de atividade. Foi um dos maiores resgates de informação secreta de sempre. Em outubro, Mitrokhin obteve asilo e ficou a viver no Reino Unido com identidade falsa, colaborando com o MI6 na tradução dos manuscritos. O impacto dos manuscritos Mitrokhin foi enorme, incluindo listas de agentes, infiltrados e colaboradores do KGB na Europa e os EUA e detalhe sobre as informações que forneceram. Foi o maior “rombo” de sempre na espionagem do KGB. Ficou-se a saber, por exemplo, como o KGB tinha preparado uma campanha de desinformação para prejudicar a eleição de Ronald Reagan. Anos depois, Mitrokhin foi autorizado a publicar a sua história em livro e a revelar inúmeras operações de espionagem do KGB. Entre elas, o modo como Svyatoslav Kuznetsov, agente do KGB junto da embaixada da URSS em Lisboa se encontrou com Álvaro Cunhal para combinar o recrutamento de seis informadores. Objetivo: facultar ao KGB o máximo de informação possível sobre os serviços de informações portugueses e sobre a NATO. As notas de MitrokhIn indicam dois advogados ao serviço do governo, um advogado ligado aos sindicatos sindical, um conservador do registo civil e dois jornalistas. A história de Vasili Mitrokhin, incluindo este e muitos outros episódios, está neste livro THE SWORD AND THE SHIELD – THE MITROKHIN ARCHIVE AND THE SECRET HISTORY OF THE KGB.
Apanhados entre Atenas e Esparta, os melianos (habitantes da ilha de Melos) tentaram em vão convencer os atenienses a desistir da invasão (416 a..) , a troco da sua neutralidade. A resposta dos atenienses dissipou todas as ilusões: “não entrastes com eles na guerra, pensando que assim nos convenceis, ou então que em nada nos fizestes mal; esperamos que em vez disso analiseis o que é praticável, dentro do realismo que anima o pensamento de cada um de nós, pois sabeis como nós sabemos, que o que é justo na vida humana só é avaliado em circunstâncias equivalentes, e que os mais fortes fazem o que podem, enquanto os mais fracos fazem o que devem.“
Escrito em forma quase teatral, o diálogo entre atenienses e melianos é um dos episódios mais citados da ‘História da Guerra do Peloponeso‘ a obra com que deu a Tucídides a reputação de um dos grandes primeiros historiadores. Numa obra cheia de detalhes militares, o episódio indica a relevância da “lei dos mais forte” e da chantagem nas relações internacionais. Se um dos lados se acha superior em poderio militar, não se contenta com a neutralidade e por isso não prescinde de impor a submissão a todos os povos à sua volta. O diálogo não resultou. Os melianos tiveram se escolher entre a guerra e a servidão. A História da Guerra do Peloponeso foi traduzida do grego para a língua portuguesa por Raul M. Rosado Fernandes e M. Gabriela P. Granwehr, e editada pela Fundação Calouste Gulbenkian. O episódio das negociações entre melianos e atenienses está nas páginas 507 a 518 ou, se preferirmos, nos parágrafos LXXXIV a CXVI). A citação feita no parágrafo anterior está na página 509 (parágrafo LXXXIX). A segunda edição publicada em 2013, pode ser adquirida na livraria da F.C.G. Existe também uma versão em pdf, disponibilizada gratuitamente pela F.C.G..
Outra versão da obra de Tucídides, resultou da tradução de Mário da Gama Kury e foi publicada pela Editora da Universidade de Brasília em parceria com o Instituto de Pesquisa de Relações Internacionais, em 1989. O episódio está nas páginas 346 a 354 (parágrafos 84 a 116).
Também esta versão está disponível em pdf, por iniciativa dos editores. É, portanto fácil obter qualquer uma das versões na internet. Mas, se estiver interessado e não tiver tempo ou paciência para as encontrar, esta página pode fazer o trablho por si. Basta nos envie o comprovativo da doação de alguns euros a uma IPSS à sua escolha e enviaremos de volta os ficheiros pdf.
Melos é uma das ilhas paradisíacas da Grécia, cujas imagens dificilmente são compatíveis com pensamentos bélicos. A guerra só é compatível consigo própria.